DE PRÊMIOS, ARMADILHAS E OUTRAS COISAS
E não adianta pensar em mudar de vida, comprar uma casa no
campo, viajar por lugares exóticos,
morar numa cidade ainda mais cosmopolita,
ter filhos ou não tê-los,
aposentar-se logo que possível... não, não adianta: a vida,
a nossa espreita em cada esquina,
ungindo os cheiros das distâncias, os planos da economia, a
subida do dólar, o amparo da alegria, a visita dos amigos,
a vida tem, a nossa revelia, seus prêmios
e armadilhas para distribuir. Não,
não adianta pensar em mudar de vida (todo lugar é Rio),
mas viver a vida, vivê-la na cidade, no campo, no mijo,
no mosteiro do himalaia, em ivolândia... dar aulas na
universidade, publicar um livro sem leitores, vender imóveis
alheios e depauperados. Viver, viver a vida,
vivê-la a cada instante, subir seus picos, frios,
no sol ou na noite, o da pedra do sino, o da bandeira,
o kilimanjaro, e depois descê-los, aproveitar as madrugadas
de peitos e vagina, de pêlos e pênis, o amor encontrado
ou perdido, exercitando sempre, passo a passo,
o vigor possível: em longas caminhadas,
quem enxerga são as pernas.